sexta-feira, 13 de julho de 2012

EURO: a parte visível do nosso empobrecimento


"A Europa caminha a passos largos para a desagregação. Independentemente da posição de cada um sobre o percurso europeu desde o Tratado de Roma de 1957 é fácil perceber que tanto a CEE, então criada por seis países, como a CE que lhe sucedeu e agora a União Euroepia (alargada a 27) têm contribuído para o estabelecimento de um espaço geostratégico livre de conflitos armados desde a 2ª Guerra Mundial. A excepção a esta regra foram as Balcãs, cujos países, após o fim da barbárie em que mergulharam na última década do século XX entraram, ou aguardam a entrada na União Europeia. A desagregação desta torná-los-á, de novo, nos primeiros protagonistas de um conjunto de conflitos que farão a Europa regressar aos seus piores pesadelos.
As raízes deste problema são várias, mas o caminho para o abismo pode ser facilmente identificado. Desde logo o predomínio do financeirto sobre o económico e a a sua supremacia sobre o poder político. O capitalismo de casino, centrado inicialmente na Europa e nos Estados Unidos, prefere, há mais de duas décadas, transformar dinheiro em mais dinheiro sem passar pelo processo produtivo. As consequências desta actuação têm sido devastadoras para os países mais avançados do hemisfério norte e ameaçam a sua sobrevivência económica, social e cultural. No caso europeu, para nos centrarmos no nosso espaço, à deslocalização inicial de empresas produtivas para o extremo oriente, tendo em vista explorar os baixos salários e a ausência de direitos dos trabalhadores, sucedeu-se a transferência meteórica de tecnologia e o aumento imparável da dependência das fontes energéticas. A perda da competitividade com os países emergentes era inevitável. A solução para o problema não foi voltar ao processo produtivo mas sim desmantelar o Estado Social e empobrecer os trabalhadores, e a sociedade em geral, com a consequente sanaha destrutiva dos direitos de quem trabalha.
Tendo como pano de fundo esta mudança de paradigma, no mundo e na Europa, e embora a moeda única seja um mero instrumento, no curto prazo o centro deste furacão está no Euro! Apesar de apenas dezassete dos vinte e sete países da União Europeia o usarem como moeda própria, o seu eventual desmoronamento arrastará consigo o fim da União Europeia, e lançará o mundo inteiro numa espiral recessiva com consequências dramáticas para todos os trabalhadores e para as suas populações de todo o mundo.
Em países periféricos como Portugal e a Grécia, considerados os elos mais fracos de uma moeda que começa a não ter pernas para andar, e por isso sujeitos a programas de austeridade dantescos que arrasam os pilares do Estado Social a uma velocidade sideral, a questão da sua manutenção no espaço da moeda única está na ordem do dia." António Nabarrete (membro do SN da Fenprof) in Fenprof nº 260 (julho 2012)


Entrevista da Fenprof a Eugénio Rosa (ER) e Sérgio Ribeiro (SR) (Economistas):


Fenprof: Como avalia hoje a adesão de Portugal ao euro?


ER: "Em termos de crescimento económico, nos 11 anos que antecederam a entrada na Zona Euro (1991/ 2001) a média das taxas de crescimento foi de 2,6%, nos 11 anos seguintes do euro (2002/2012) a média do crescimento foi de apennas 0,01%. E neste momento, Portugal está mergulhado numa recessão económica prolongada, cujo fim é impossível de prever a continuar a actual política de austeridade violenta.
Como consequência deste crescimento económico anémico, a taxa de desemprego durante o período do euro nunca parou de subir e, com recessão económica, o desemprego disparou atingindo actualmente a taxa oficial 15,3%, e a ataxa real mais de 22%. Estimamos que a continuar esta política recessiva no fim do ano existirá em Portugal mais de 1.274.000 desempregados, o que corresponde a taxa de desemprego real de 22,4%.
Coexistindo com esta situação verificou-se em Portugal, com a entrada na zona Euro, um agravamento das desigualdades que o governo e a banca procurarm temporariamente esconder através de crédito barato, para não ter de aplicar por uma política de rendimentos que combatessem as desigualdades, o que levou centenas de milhares de famílias, para poderem melhorar a sua vida, a se endividarem muito, enfrentando actualmente sérias dificuldades para sobreviverem."


SR: "Avaliação negativa, a partir do critério do interesse nacional, enquanto Estado-nação, soberania nacional, nível de vida dos trabalhadores  e da população. Desvalorizaram-se as potencialidades do País, por desaproveitamento dos recursos naturais e adquiridos - quando não se destruíram -, com utilização perversa dos fundos comunitárias para abate de barcos, anulando a nossa vantagem comparativa do imenso mar (ZEE), com colocação de terras em pousio e subsídios à propriedade e não á produção, com encerramento de estaleiros navais e siderurgia e demais actividade industrial; agravamento das desigualdades sociais e assimetrias regionais; financeirização/ banqueirização da economia e concentração da riqueza. 


Quais as consequências positivas da saída de Portugal do Euro?


ER: "Portugal com a entrada na U.E, mas particularmente com a sua adesão prematura à Zona Euro, pois não estava preparado para o fazer, perdeu parcelas muito importantes da sua soberania. E duas delas forma a soberania monetária e cambial. A perda de soberania monetária, que resultou da sua transferência para o BCE (o Banco de Portugal deixou de ter capacidade para emitir moeda), determinou que o estado esteja totalemente dependente das chamados "mercados", que são os grandes bancos, companhias de seguros e fundos, e portanto sujeitos às suas composições. Uma das justificações habitualemnte utilizadas pelo próprio governo é de que esta política é necessária para "agradar aos mercados", ou aos credores, e para "voltar aos mercados". Portanto, o sair da Zona Euro significava que o Banco de Portugal poderia emitir moeda e, consequentemente, finnanciar o Estado e os bancos, para estes poderem conceder crédito, em moeda nacional.
O mesmo não aconteceria com dívidas em divisas, já que o Banco de Portugal não poderia emitir moeda estrangeira, sendo necessário para as saldar as receitas das exportações e empréstimos internacionais. Para além disso, a política cambial, que neste momento é da competência do BCE (e o euro é uma moeda sobrevalorizada o que torna caras as exportações portuguesas); repetindo, a política cambial passaria a ser da competência do governo português o qual poderia utilizá-la, como aconteceu várias vezes no passado, para aumentar a competitividade das empresas portuguesas, tornando os seus produtos mais baratos para os estrangeiros , promovendo assim as exportações, o que contribuiria para aumentar o emprego e dinamizar a economia."


SR: "Embora dependente da capacidade de negociação - por que só assim encaro essa saída -, sendo esta o reflexo da correlação de forças sociais, terá sempre consequências muito gravosas no plano social, embora no plano económico e de competitividade externo sejam claramente positivas desde que não se aceite a submissão a uma "divisão europeia do trabalho" como a que exige a moeda única. A questão foi o modo como foi construído tal instrumento (para o capital financeiro) e termos entrado, a saída,a  verificar-se terá o seu custo social, mas a manutenção na União Económica e Monetária, tal como é, não os tem menores. Pelo que o aspecto positivo, induubitável, é o de corte com o caminho do desastre inevitável. De qualquer modo, a "contabilização" é impossível se não se ponderar com a dimensão tempo e criação de condições para outro futuro  que não este caminho em que a adesão nos colocou, como País soberano."


Que obstáculos (aspectos negativos) se podem colocar a esta saída e, caso seja uma perspectiva a considerar, que medidas devem ser adoptadas para salvaguardar a economia do país?


ER: "É difícil, para não dizer mesmo impossível, saber com exactidão as consequências da saída do euro. tudo o que se tem dito ou se possa dizer são previsões muito falíveis. No entanto, é possível já imaginar algumas prováveis consequências. Uma das que se tem falado muito seria a fuga de capitais. No entanto, é possível aplicar medidas de controlo que limitem esse efeito.
A desvalorização da moeda nacional, para promover as exportações, determinaria um aumento significativo da inflação interna, como sucedeu aquando das intervenções anteriores do FMI, o que provocaria a redução do poder de compra dos salários e pensões, que teria de ser compensada, pelo menos em parte, por uma adequada política de rendimentos, sabendo-se que funcionaria a chamada "ilusão monetária" que levaria à perda de poder de compra de forma não sentida.
Um problema que se colocaria seria o elevado endividamento das famílias e das empresas à banca o que determinaria, para a banca não falir, a actualizações periódicas dessas dívidas ou das taxas de juro, embora tivesse de ter em conta parãmetros da política de rendimentos para não tornar a vida das famílias e empresas endividadas impossível. Em relação às poupanças depositadas na banca, convertidas em moeda nacional, o seu rendimento, reflectido nas taxas de juro, teria de se ajustar à inflacção.
Um problema grande era a dívida do país (Estado e privados) ao estrangeiro, que continuaria em moeda estrangeira, o que teria de ser pago em divisas. E aqui a garantia de finaciamento pela União Europeia seria importante, através de uma saída ordenada da zona euro. É evidente que a dívida externa do Estado teria de ser renegociada (prazos, juros e valor) para não ser um obstáculo intransponível à recuperação do país o que deveria entrar nas compensações a conceder a Portugal pelos países do Euro."


SR: "Insisto na ideia da correlação de forças sociais, de que tudo dependerá. Mantendo-se o sistema económico-social que existe, os aspectos negativos seriam os de enorme  desvalorização da "nova" moeda, com grandes custos sociais para os trabalhadores e populações, embora criando novas condições de competitividade exterior que poderiam ajudar a relançar a economia. Mas, no quadro de uma mudança sócio-política recuperando "valores de Abril", esses inevitáveis aspectos negativosseriam, no tempo, recuperados por uma valorização da produção interna (aproveitando os nosos recursos), uma dignificação e qualificação do trabalho, um mercado interno a ser uma componente válida e fundamental da economia portuguesa num caminho para um outro futuro."

Carlos Carvalhas em 97 Sobre a Moeda Única


AFINAL, O HOMEM TINHA RAZÃO.

«A moeda única é um projecto ao serviço de um directório de grandes
potências e de consolidação do poder das grandes transnacionais, na guerra
com as transnacionais e as economias americanas e asiáticas, por uma nova
divisão internacional do trabalho e pela partilha dos mercados mundiais.
A moeda única é um projecto político que conduzirá a choques e a pressões a
favor da construção de uma Europa federal, ao congelamento de salários, à
liquidação de direitos, ao desmantelamento da segurança social e à
desresponsabilização crescente das funções sociais do Estado.»

Carlos Carvalhas, Secretário-geral do PCP — «Interpelação do PCP sobre
a Moeda Única»
Blogue interessante sobre actualidade europeia: http://veritaedominus.wordpress.com/


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