sábado, 16 de março de 2013

Andámos a viver aquém das nossas possibilidades

Excelente texto de Rui Tavares, no Jornal Público de 25 de Fevereiro:

"Temos andado a viver claramente aquém das nossas possibilidades democráticas. A nossa democracia vive muito aquém das suas possibilidades políticas- ou seja, das possibilidades de nos dar novos possíveis.
Quiseram convencer-nos de que o nosso grande problema foi termos andado vários anos a viver além - acima, para lá- das nossas possibilidades. É mentira, raios! Foi precisamente o contrário que aconteceu: andámos anos e anos a viver aquém das nossas possibilidades enquanto portugueses, enquanto europeus e enquanto cidadãos. Fomos governados abaixo das possibilidades de transparência, de justiça e de progresso. Abaixo das necessidades, é certo. Abaixo do que seria desejável, e é da vida. Abaixo do que merecíamos, presumimos nós. mas o grande problema é que foi abaixo - aquém -das nossas possibilidades. Isso é verdadeiramente trágico.
O nosso debate público está aquém das suas possibilidades de informação, de esclarecimento e de abertura. A nossa justiça está aquém das suas possibilidades, a nossa economia aquém das suas possibilidades, os nossos políticos a muito aquém das suas possibilidades.
Por isso há jovens e adultos que todos os dias pensam se devem abandonar o país -recusam conformar-se a uma vida vivida sempre aquém das suas possibilidades. Por isso há tanta gente que ama este país e teme não conseguir aguentá-lo.
A democracia, a inteligência e a vida dão-nos mais que isto. É preciso começar a viver de acordo com essas possibilidades. Elevar o grau de exigência sobre a nossa política, trazer uma reforçada cultura cívica para o debate público está nas nossas possibilidades. Iniciar a democracia europeia e reiniciar a democracia portuguesa está nas nossas possibilidades. Está nas nossas possibilidades, acima de tudo, fazer o correcto diagonóstico do que nos está acontecer - sem o qual nunca recuperaremos. Isto já não é uma crise. Isto é uma depressão, ou seja- nas pessoas como nas nações e nas economias -, uma permanente vida mal vivida, prolongadamente aquém das possibilidades que a vida tem. Nós podemos melhor do que isto."